Clássicos 10 Set 2020

“Gazelle” e “Pantere”, as berlinas desportivas da Alfa Romeo ao serviço da lei

Na Itália do pós-guerra, os Alfa Romeo são uma lenda. Demonstraram em pista e em estrada que são mais rápidos do que qualquer outra viatura. São potentes e vencem sempre – como o bem sobre o mal. Têm todas as características técnicas e simbólicas para se tornarem os veículos das Forças de Segurança.

A ligação entre a Alfa Romeo e as Forças de Segurança é um pedaço da história da República. A partir dos anos cinquenta, os Alfa Romeo são escolhidos para o serviço de intervenção rápida. Tornam-se os volanti, uma presença familiar para os cidadãos, e passam a fazer parte da linguagem comum: os da Polícia são designados “Pantere” e os dos Carabinieri são conhecidos como “Gazzelle”. Duas metáforas para potência e agilidade.

O primeiro Pantera é um Alfa Romeo 1900 de 1952: são as linhas agressivas que servem de inspiração ao nome.



O primeiro Gazzella surge poucos anos depois. O mais famoso de todos é o Giulia Super; mas as Forças de Segurança recrutam muitos outros Alfa Romeo, praticamente todos os modelos mais importantes, do Matta ao Alfasud, do Alfa 75 ao Alfetta, do 156 ao Giulia dos nossos dias.


A Alfa Romeo é um modo de viver

A história da ligação com as Forças de Segurança corre a par e passo com a história da evolução da Alfa Romeo. E este tema leva-nos até outro protagonista: um turinense com origens na Sardenha, Orazio Satta Puliga, grande fã da Alfa Romeo.

A ele se deve a famosa frase: “Há muitas Marcas de automóveis e entre elas a Alfa ocupa um lugar à parte. É uma espécie de doença, o entusiasmo por um meio de transporte. É um modo de viver, um modo muito particular de conceber um veículo a motor.”

Nomeado director de projectos em 1946, Satta Puliga tem diante de si uma árdua tarefa: não só reconstruir o que a guerra destruiu, mas também transformar uma empresa artesanal numa fábrica moderna, prosseguindo no caminho iniciado por Ugo Gobbato.

Satta Puliga mete mãos à obra de imediato. À sua chegada, a Alfa Romeo produz em Portello cada peça mecânica, com base em critérios de carácter muito artesanal; Gobatto racionaliza o processo, subcontrata a produção dos componentes secundários e reduz os custos. E entretanto pensa em criar os novos Alfa Romeo “de série”, a serem construídos com as mais eficientes metodologias técnicas e organizativas disponíveis na altura.


1900, a primeira pantera

O modelo 1900 de Satta Puliga de 1950 é o primeiro Alfa Romeo com volante à esquerda e o primeiro a adoptar uma estrutura de carroçaria auto-portante. Abandonou os tradicionais seis e oito cilindros em favor de um novo motor de quatro cilindros com cabeça de alumínio e duas árvores de cames comandadas por corrente. O motor é alimentado por um único carburador e oferece prestações brilhantes e baixa carga fiscal. O 1900 debita 80 cv, é agressivo e rápido, correspondendo ao que se espera de um Alfa Romeo, mas é também muito fácil de conduzir. Por outras palavras, dirige-se a um mercado mais lato. O slogan que acompanha o lançamento é: “O carro de família que vence corridas”.

O 1900 é também o primeiro Alfa Romeo a nascer numa linha de montagem. Uma verdadeira revolução: o tempo de produção de um automóvel completo desce de 240 para 100 horas. A nova abordagem leva a um sucesso comercial nunca visto: sozinho, o 1900 vende mais do que todos os outros modelos Alfa Romeo até àquele momento.

O resultado nasce de uma cuidadosa gestão do ciclo de produto. São introduzidas versões de altas performances (1900 TI, 1900 C Sprint e Super Sprint, 1900 Super) que vencem importantes competições internacionais na respetiva categoria.

E continua a colaboração com os carroçadores: com base na mecânica do 1900, nasce a série dos protótipos BAT (Berlinetta Aerodinamica Tecnica), assinados por Bertone e desenhados pelo jovem Franco Scaglione.

O mesmo motor do 1900 é ainda adoptado pelo AR51, mais conhecido como “Matta”: um 4×4 nascido para substituir os veículos de todo o terreno do pós-guerra das Forças Armadas Italianas.


Um milanês que ama a cultura e o boxe

Se com o 1900 a Alfa Romeo enveredou pela via da produção em série, é com o Giulietta que se transforma numa grande fábrica de automóveis. O homem que conduz a transformação é Giuseppe Luraghi.

Nascido em Milão, praticou também a “nobre arte” do boxe durante os anos passados na Universidade Bocconi. Quando entra nas nossas histórias, já tem uma consistente reputação como gestor, com longa experiência na Pirelli. Entre 1951 e 1958, desempenha o cargo de diretor-geral da Finmeccanica, a holding que controla a Alfa Romeo. Depois de um breve parêntesis na Lanerossi, volta em 1960 como presidente da Alfa Romeo, posição que manterá até 1974.

Escritor, jornalista, editor, Luraghi promove iniciativas culturais também no seio da empresa. Em 1953, confia a Leonardo Sinisgalli, “o poeta engenheiro”, a tarefa de criar uma revista que estabeleça o diálogo entre a cultura humanística, o conhecimento técnico e a arte. Nasce assim “La Civiltà delle Macchine” (“A Civilização das Máquinas”), onde escrevem também Ungaretti e Gadda.


No limiar do “boom”

Quando ingressa na Alfa Romeo, Luraghi revoluciona a estrutura da produção chamando Rudolf Hruska, designer, e Francesco Quaroni para reorganizar os processos industriais. Há uma grande oportunidade que é preciso agarrar: a marca goza de excepcional visibilidade, as suas vitórias desportivas entusiasmam e fazem sonhar milhões de pessoas. É preciso dar a tudo isto uma resposta comercial. Estamos no limiar do boom económico e o automóvel é o bem mais desejado: ser dono de um Alfa Romeo tem de tornar-se a prova visível de que se venceu na vida.

De produto de elite a objecto de desejo: a marca concentra os seus recursos industriais e de projectação neste sentido. E o Giulietta nasce para ser o modelo da viragem – que faz aumentar as vendas, mas que, ao mesmo tempo, confirma a tradição técnica e a vocação desportiva da marca.


Giulietta, o primeiro “gazzella”

O novo modelo remete-nos para a ligação da Alfa Romeo às Forças de Segurança. O primeiro Gazzella dos Carabinieri é exatamente um Giulietta destinado ao serviço de patrulha, e é fornecido já equipado com sistema de rádio para ligação à central. Na linguagem daquela força, o Gazzella identifica-se com o condutor de veículo de patrulha:veloz, ágil e resistente. Estas características são imediatamente transferidas para a viatura.
Mais curto, mais estreito, mais leve do que o 1900, o Giulietta leva a Alfa Romeo até um segmento novo, dirigido a um novo público. Oferece linhas externas modernas e elegantes e, no interior, grande habitabilidade, além de estabilidade, recuperações rápidas e velocidade. O motor (inteiramente em alumínio) debita 65 cv e proporciona 165 km/h de velocidade máxima.

O Giulietta é apresentado no Salão de Turim de 1954 em versão coupé. O Giulietta Sprint, desenhado por Bertone, é baixo, compacto e esbelto e torna-se um instant classic. De notar que a versão desportiva nasce antes do modelo standard: uma escolha pouco convencional (e muito Alfa Romeo), proposta novamente, há poucos anos, pelo Giulia Quadrifoglio.
O Giulietta conquista um excepcional nível de popularidade que lhe vale o cognome de “namorada de Itália”. O resultado de vendas é igualmente extraordinário: mais de 177.000 unidades.


Giulia, a revolução

Só um automóvel revolucionário poderá substituir o Giulietta. Satta Puliga sabe-o bem. E a sua equipa (Giuseppe Busso, Ivo Colucci, Livio Nicolis, Giuseppe Scarnati e o piloto de testes Consalvo Sanesi) desenvolve um modelo decididamente à frente do seu tempo.

O Giulia é um dos primeiros automóveis do mundo com estrutura auto-portante de deformação diferenciada. Tanto a parte dianteira como a traseira são estudadas para absorver a força de uma eventual colisão, sendo o habitáculo extremamente rígido para proteger os ocupantes: soluções que só muito depois virão a tornar-se obrigatórias.

O motor 1.6 de duas árvores de cames do Giulia é uma evolução do 1.3 de quatro cilindros e distingue-se pelas válvulas de escape arrefecidas a sódio.
Também o design do Giulia é revolucionário. O Giulia é compacto, com volumes bem proporcionados e estilo único. A frente baixa e a traseira cortada são inspiradas em motivações aerodinâmicas. “Desenhado pelo vento”, diz a publicidade de lançamento. Graças ao inovador trabalho de desenvolvimento no túnel de vento, o Cx do Giulia é extraordinário para a época: só 0,34.

O modelo alcança excepcional sucesso: mais de 570.000 vendas no total (mais do triplo do Giulietta). O Giulia torna-se um ícone italiano.
No Museo Storico Alfa Romeo de Arese, os visitantes encontram uma sala dedicada à participação da Marca no cinema. Entre muitas presenças ilustres, o Giulia destaca-se como protagonista absoluto de muitos filmes policiais da altura. Nascidos como “Filmes B”, virão a tornar-se objecto de culto. Nestas películas, onde se defrontam “polícias e ladrões”, o Giulia é frequentemente tanto o carro da polícia como o veículo de fuga.

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Automóvel MG TD €1

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