Clássicos • 27 Ago 2022
Alfa Romeo 24 HP, das origens às primeiras vitórias internacionais
Quase um milhão de pessoas visitaram os concessionários no primeiro domingo de “portas abertas”. Cerca de 100.000 encomendas em poucos meses. 680.000 vendas totais entre 1997 e 2005. Estes números fazem do 156 um dos mais bem-sucedidos modelos Alfa Romeo da história.
O 156 foi apresentado aos meios de comunicação social internacionais em 1997, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa. A Alfa Romeo assumiu claramente a sua intenção: criar uma berlina que combinasse excelência estilística com um comportamento dinâmico irrepreensível, num perfeito equilíbrio entre performance e estabilidade. Uma fórmula de produto 100% Alfa Romeo.
O objectivo era extremamente ambicioso – e o resultado foi um dos melhores automóveis de tracção dianteira de sempre.
Alfa Romeo e tração dianteira
As primeiras viaturas eram construídas com tracção traseira. Mas, desde o princípio, a hipótese da tracção dianteira fascinava os designers. A ideia surgiu no seio da Alfa Romeo no primeiro período do pós-guerra. Satta Puliga e Busso tinham sido convencidos do potencial desta solução e deram início a um programa de desenvolvimento que tinha como objectivo fazer do 1900 o primeiro tracção dianteira da marca. Contudo, a empresa decidiu seguir numa direcção diferente: no início da década de 1950, foi considerada a ideia de criar um Alfa Romeo mais pequeno com tracção dianteira, levando ao estudo de vários tipos de grupos moto-propulsores.
Nenhum destes projectos, porém, chegaria à fase de industrialização. Mas a decisão foi apenas adiada. A Alfa Romeo resolveu ampliar a sua gama com um modelo ligeiramente abaixo do Giulietta: um modelo compacto “a toda a velocidade”, para impulsionar as vendas.
Desta vez, o novo projecto foi confiado a Rudolf Hruska, o ‘pai’ das várias versões do Giulietta. A Alfa Romeo encarregou-o de assumir uma dupla responsabilidade: projectar, simultaneamente, o novo modelo e a fábrica onde seria construído. E assim nasceu o Alfasud, o primeiro Alfa Romeo com tracção dianteira.
O Alfasud surgiu tanto “de uma folha em branco” como “do projecto campos verdes”: foi um dos raros casos em que uma fábrica de automóveis foi concebida e construída para produzir um modelo específico. O veículo não tinha restrições técnicas a respeitar, excepto ser fiel aos seus objectivos de produto.
“Obviamente tinha de ser um tracção dianteira. E tinha de ser um super-compacto de luxo, com cinco lugares e bagageira muito grande.” Hruska definiu assim o projecto alguns anos mais tarde.
O motor boxer de 1,2 litros (com cilindros opostos) foi preferido ao quatro cilindros em linha, porque era mais baixo e mais adequado a um perfil aerodinâmico. A inédita carroçaria de “dois volumes” foi criada para melhorar o acesso à bagageira – com 400 litros de volume, graças à colocação do depósito de combustível sob o banco traseiro, em vez de entre o banco e a área de bagagem. Isto resultou de uma abordagem inovadora, funcional e segura que de imediato foi amplamente imitada.
O Alfasud foi a primeira encomenda importante recebida por Giorgetto Giugiaro e provou ser um enorme sucesso comercial. Para respeitar todas as limitações de espaço e dimensões, o jovem estilista inventou a característica “traseira alta” e ligou-a à frente aerodinâmica através de uma simples linha optimizada.
O Alfasud entrou em produção em 1972, ano em que a marca ultrapassou um milhão de unidades fabricadas desde a sua fundação. Por si só, o Alfasud quase igualou este recorde, com 900.925 unidades produzidas entre 1972 e 1984 (sem contar com as versões Sprint). Tornou-se o Alfa Romeo mais vendido de sempre.
Da racionalização da produção à centralidade da marca
Em 1986, o IRI (Instituto público para a Reconstrução Industrial, proprietário da Alfa Romeo desde 1933) vendeu a marca ao Grupo Fiat e, como em todos os processos de integração industrial, os primeiros anos foram dedicados principalmente à racionalização da produção e às cadeias de fornecimento.
Na década de 1980, a palavra de ordem de todos os fabricantes de automóveis era “sinergia”. Processo e produto eram cada vez mais estandardizados. Muitos componentes eram partilhados por razões de custos. Os designers eram obrigados a respeitar restrições rígidas (como as dimensões das portas), o que sufocava a criatividade.
Nos anos seguintes, todas estas regras foram flexibilizadas. Os clientes não gostavam da homologação excessiva e começaram a procurar viaturas mais reconhecíveis. A personalidade da marca retomava a importância perdida, influenciando as escolhas. Este ponto de viragem mudou a história do design automóvel no virar do século.
Condução desportiva, performances elevadas, inovação (e estilo)
Para a Alfa Romeo, isto significou o regresso às origens. O primeiro grande passo para relançar as características distintivas da Marca foi reanimar a Alfa Corse, gloriosa equipa de competição onde o jovem Enzo Ferrari tinha dado os primeiros passos. Em 1993, o 155 GTA participou no DTM, campeonato de viaturas de turismo da Alemanha, tendo ao volante Nicola Larini – que chegou em primeiro em 11 de 20 provas, levando a Alfa Romeo ao lugar mais alto do pódio de Nürburgring pela primeira vez.
O contributo do design foi primordial. O 164 de 1987, o primeiro topo de gama com tracção dianteira da marca, foi desenhado por Pininfarina… Mas, a partir desse momento, o papel do Centro Stile Alfa Romeo interno tornou-se cada vez mais importante.
Em Arese, as tecnologias mudavam, as pessoas mudavam, o processo mudava. Novos sistemas computorizados foram introduzidos nos processos de design e de execução de protótipos. A equipa do Centro Stile foi integrada com plataformas de design e participou também em escolhas tecnológicas – ao fim e ao cabo, o que é funcional também deve ser bonito e vice-versa. Forma e substância andam sempre a par e passo: é a “beleza necessária” da Alfa Romeo.
Desenhando uma nova gama
O Centro Stile não criou só o estilo de um modelo: desenhou toda uma gama. E, alguns anos mais tarde, o sonho tornou-se realidade. Em 1995, a marca introduziu um original dois volumes (o 145) no segmento “C”, a que se juntou, um ano depois, a versão de dois volumes e meio (o 146). Seguiram-se os modelos desportivos GTV e Spider, criados em colaboração com a Pininfarina. Mas o verdadeiro ponto de viragem chegou com o 156.
O estilo do 156 era um extraordinário mix de força, inovação e classicismo. O escudo dianteiro recupera o seu destaque e projecta as próprias linhas em direcção ao capot. Visto de frente, os guarda-lamas nivelados com a carroçaria pareciam “fixados às rodas”, transmitindo força e aderência à estrada. A relação entre vidro e metal fazia lembrar mais um coupé que uma berlina. Os puxadores das portas traseiras desapareceram, integrados de forma quase invisível na moldura das janelas, enquanto os lados depurados realçavam a elegância e o perfil dinâmico da viatura. “Parece estar em movimento mesmo quando está parado”, comentou de’ Silva.
O 156 marcou o regresso à pesquisa cromática anteriormente vislumbrada no Carabo e no Montreal. Os designers da Alfa Romeo inspiraram-se na colecção do Museu, conservada no mesmo edifício onde se encontra hoje: observando a cor do 8C 2900 B de 1938, criaram o azul “Nuvola”, obtido com múltiplas camadas com efeito micalizado que conferia ao modelo um brilho iridescente.
Temperamento desportivo avançado
O 156 era um automóvel admirável também do ponto de vista técnico. Tinha sido pedido aos designers que desenvolvessem o conceito de “temperamento desportivo avançado”, combinando potência, peso reduzido e controlo. Esta tinha sido sempre a fórmula que caracterizava a condução Alfa Romeo.
Para atingir este objectivo, foram introduzidos novos materiais (por exemplo, magnésio e aços “brancos personalizados”), projectados sistemas de suspensão extremamente sofisticados (por exemplo, os braços dianteiros em quadrilátero alto) e dado particular cuidado à optimização mecânica para realçar o comportamento dinâmico e a precisão da trajectória.
O 156 convenceu todos: era a berlina mais entusiasmante de conduzir de toda a sua geração. O modelo desportivo era um vencedor: em 10 anos de campeonatos de Gran Turismo, conquistou 13 títulos.
O nascimento do common rail
Na altura do lançamento, os motores eram seis. O Busso V6 era acompanhado por três motores “Twin Spark” que, pela primeira vez, combinavam ignição dupla (tecnologia anteriormente utilizada por Giuseppe Merosi, em 1914) com quatro válvulas por cilindro.
De acordo com a lógica do mercado europeu da altura, a gasolina era o combustível dominante; mas estas regras estavam prestes a mudar. E foi a Alfa Romeo que lançou a revolução: o 156 foi a primeira viatura do mundo a apresentar o sistema common rail.
Os jornalistas que testaram as versões 1.9 e 2.4 JTD em Lisboa estavam impressionados: pela primeira vez, motores diesel ofereciam performances ao nível dos motores a gasolina, em silêncio e conforto.
“Car of the Year”
O 156 conquistou o coração de público e de críticos e, em 1998, o prémio “Car of the Year” internacional foi, pela primeira vez, atribuído à Alfa Romeo. O irmão mais jovem, o 147 (que partilhava não só o family feeling estilístico, mas também plataforma, suspensão e motores) seguiu-se alguns anos depois, tendo conquistado o mesmo título em 2001.
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