MTX Tatra V8: O Superdesportivo nascido por detrás da Cortina de Ferro

Clássicos 02 Jul 2024

MTX Tatra V8: O Superdesportivo nascido por detrás da Cortina de Ferro

Por Pedro Fernandes

Um dos mais improváveis superdesportivos a ver a luz do dia na década de 90, o MTX Tatra V8 causou furor aquando da sua apresentação. Para a (então) Checoslováquia, a produção de um automóvel desta natureza constituía uma interessante oportunidade de afirmação política e ideológica; para a Tatra, o novo modelo providenciava algo muito mais valioso: a hipótese de declarar alto e bom som que uma das mais inovadoras fabricantes de automóveis de sempre não só ainda estava viva, mas que era também capaz de surpreender e de deixar a sua distinta marca no segmento mais emblemático do mundo das quatro rodas.

Em actividade desde o final do século XIX, a Tatra foi pioneira no campo da aerodinâmica automóvel, tendo produzido alguns dos modelos mais arrojados dos últimos 100 anos, nomeadamente, os revolucionários T77/87/97 e o luxuoso 603. Avessa à convenção, a engenharia praticada pela Tatra definiu-se como de tal modo vanguardista que acabou por “inspirar” e influenciar determinantemente o percurso da Porsche e da Volkswagen.

Já a Metalex (MTX), a parceira da Tatra na criação do superdesportivo, encontra-se envolvida na concepção de automóveis de competição (adaptação de Ladas e Škodas) para múltiplas disciplinas desde o final da década de 60 e, no início de noventas, estava pronta para trabalhar em algo próprio e especial.

O MTX Tatra V8 foi fruto da imaginação do designer checo Václad Král, o qual viria a ser também responsável, em 1993, pelo criação do Innotech Mysterro, um protótipo que agarrou a atenção dos entusiastas de automóveis pelo colarinho e que preconizou o C8 25 anos antes da Chevrolet avançar com o conceito de um Corvette com motor central traseiro, com o Mysterro a utilizar, pela primeira vez, a motorização de um C4 nessa mesma configuração. A MTX e a Tatra, em (eventual) parceria com a Pirelli e a OZ, trabalharam então para concretizar a visão de Král.

Com uma “face” reminiscente do Elan M100 e de inspiração geral claramente bebida no XJ220 (contando até com pequenas semelhanças ao XJR-15), o MTX Tatra V8 possuía igualmente pontos comuns com o Diablo, do qual “herdara” as portas de tesoura e os faróis pop up (embora, admita-se, estes fossem comuns a muitos dos automóveis desta natureza naquele período). Equipado com um motor de 3.9L de 32 válvulas refrigerado a ar, o primeiro MTX Tatra V8 devidamente homologado para as estradas públicas foi apresentado no Salão de Praga em 1991. No evento, a Tatra terá, reportadamente, recebido duzentas encomendas para o modelo, demonstrando que o automóvel tinha efectivamente despertado a atenção do público. E, refira-se, que este aguçara igualmente o interesse de investidores, um dos quais propôs à Metalex a aquisição da parte que a companhia detinha no projecto, perspectivando subsequentemente a construção de uma nova unidade de produção, de modo a incutir um ímpeto real ao lançamento do modelo. A Metalex aceitou e a nova linha de montagem, investimento do novo proprietário do projecto, a par da Tatra, tomou forma. O futuro do Tatra V8 parecia radiante, mas as boas perspectivas não estavam para durar. Pouco tempo depois, um incêndio destruiu as novas instalações. O golpe foi devastador.

O tempo passou e, sendo a Tatra incapaz de recolocar por si própria o projecto em andamento, novos regulamentos entretanto colocados em vigor significaram a invalidez da anterior homologação do modelo, sendo necessário reembarcar num novo e dispendioso processo com o mesmo propósito; não existiam as condições para tal.

Com uma produção planeada de 100 unidades, cada exemplar teria um custo de 2.74 milhões de coroas checas (quantia que a própria Metalex equipara como, à data, o preço médio de 15 apartamentos em Praga). Contudo, dadas as circunstâncias anteriormente descritas, apenas quatro MTX Tatra V8 acabaram por ser construídos; três ficaram em mão de particulares, sendo que um desses viria a figurar na curta-metragem musical “Runaway” do infame Kanye West. Estes três exemplares encontraram-se pela primeira vez, desde 1991, reunidos para uma exibição especial patente no Museu da Tatra em Koprivnice, entre Dezembro de 2023 e Março deste ano. Um outro exemplar, o último a ser concluído (em 1993) e único equipado com injecção Bosch, o qual detém o recorde de velocidade para um automóvel checo, estabelecido em 1997 pelo piloto e ex-director da Metalex Petr Bold, residiu até recentemente, a tempo inteiro, no agora extinto Muzeum Sportovních Vozu, na República Checa, mantendo companhia com diversas lendas do saudoso Grupo B e vários outros automóveis de competição.

Actualmente, o MTX Tatra V8 define-se como um dos superdesportivos mais obscuros do século XX, juntando-se a vultos tão elusivos como o Cizeta-Moroder V16T, o Isdera Commendatore 112i e o Dauer 962 Le Mans no panteão dos automóveis de sonho ultra-raros da década de 90. No final do ano passado, a Melatex anunciou a intenção de voltar a produzir o modelo em edição limitada de dez exemplares, de características idênticas às dos exemplares de 1991, sob a liderança de figuras-chave do projecto original. A espera será, segundo a companhia, de dois anos e o preço das novas unidades não foi divulgado publicamente.

Levantar-se-á de facto o MTX Tatra V8 das cinzas?

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