Brabham BT49: O projecto-asa de Gordon Murray

Competição 25 Jun 2024

Brabham BT49: O projecto-asa de Gordon Murray

Por Paulo Alexandre Teixeira

Na sequência da temática dos carros-asa que temos vindo a dissecar, hoje apresento o Brabham BT79. Muitos afirmam que este é o melhor projeto de Gordon Murray, um carro que ele mesmo afirmou ser “um passeio no parque”, depois de anos de desafios na construção de chassis. Na realidade, foi o seu conceito de carro-asa com o motor mais conhecido do pelotão. No final, foi a simplicidade que deu os trunfos para acabar como um chassis ganhador entre 1979 e 82, sendo o maior rival do Williams FW07, outro dos vencedores desse tempo.

Tudo começou devido a uma troca de motor e, quando se estreou, o seu piloto principal decidiu pendurar o capacete… mas no final, acabou por ser o  veículo de consagração de outro piloto: o brasileiro Nelson Piquet.

Um projeto de curta duração

Desde 1976 que a Brabham tinha um acordo de fornecimento de motores com a Alfa Romeo. Com os flat-12, semelhantes aos da Ferrari, julgava-se que poderiam ser mais competitivos que os Cosworth. Contudo, foi o contrário: apesar de serem rápidos, conseguiram poucas vitórias: duas, em 1978, e em ambas as ocasiões com Niki Lauda ao volante.

Em 1979, a Alfa Romeo decidiu construir um motor de 12 cilindros, e Gordon Murray decidiu montar um chassis para acomodar esse motor. Apesar das boas posições na grelha, não conseguiram mais que dois quartos lugares e uma vitória no GP de Imola, uma prova extra-campeonato. Na mesma altura, a marca italiana construía um chassis e começou a pensar seriamente em correr com a sua própria equipa na Fórmula 1. Tinham-se estreado no GP da Bélgica, com Bruno Giacomelli ao volante, e em Setembro, no GP italiano, colocaram dois carros, pilotados por Giacomelli e pelo seu compatriota Vittorio Brambilla. A Brabham viu que isso significava o final do acordo com a Alfa Romeo e decidiu ir buscar os motores Cosworth para fazer as duas últimas corridas de 1979, ambas na América.

O BT49 era um carro-asa, mas o desenho era simples: a base era o Lotus 79, construído em aluminio, com alguns elementos em fibra de carbono. Tão simples que foi feito em… seis semanas! Ou seja, Murray nem se esforçou, porque todos pensariam que seria algo provisório, sem ousadias. E Murray também tinha outra ideia em mente: por causa dos desenvolvimentos na aerodinâmica, achava que o tempo dos motores poderosos montados em chassis simples, sem contribuição aerodinâmica, tinha chegado ao fim. No final, três chassis foram construídos, sendo dois deles BT48 modificados.

Ambos os carros tiveram a sua estreia em Montreal, no GP do Canadá. Niki Lauda deu algumas voltas na sexta-feira, encostou às boxes, foi ter com Bernie Ecclestone e disse que… ia embora. Então com 30 anos, e frustrado com uma época aquém das suas capacidades, o piloto austríaco decidiu pendurar o capacete. E o mais estranho é que Bernie aceitou prontamente.

Pouco depois, os altifalantes colocaram um apelo às bancadas para que aparecesse um piloto para guiar o carro deixado vago por Lauda. Surgiu um argentino, Ricardo Zunino, que na realidade tinha já testado com o Brabham uns meses antes e tinha ido para o Canadá, provavelmente à espera que algo pudesse acontecer na equipa. Entrou no carro e acabou a corrida na sétima posição.

Já Piquet, que se tinha estreado na F1 no ano anterior, adaptara-se rapidamente ao carro e logo em Montreal fora quarto na grelha, indo a caminho de um bom resultado quando a caixa de velocidades cedeu. Na corrida seguinte, em Watkins Glen, largou de segundo e conseguiu a volta mais rápida, mas também não chegou ao final.

Adaptação rápida

A temporada de 1980 começou com o primeiro pódio de Piquet na Argentina, com um segundo lugar atrás de Alan Jones, no Williams FW07. Três corridas depois, em Long Beach, Piquet dominou o fim-de-semana, fazendo a pole-position e liderando a corrida do principio ao fim, alcançando a sua primeira  vitória e a primeira de um piloto brasileiro em quase cinco anos. Com Emerson Fittipaldi a ser terceiro, no seu próprio carro, vê-los ambos no pódio foi uma espécie de passagem de testemunho.

Nas corridas seguintes, Piquet tornou-se no maior rival dos Williams, especialmente na segunda metade do campeonato, quando ganhou nos Países Baixos e em Itália, que nesse ano se correu no circuito de Imola. Por essa altura, sem resultados, a Brabham trocou Zunino pelo mexicano Hector Rebaque, e os resultados não foram melhores.

Ao sair de Imola com a vitória, Piquet liderava o campeonato com mais um ponto que Alan Jones. No Canadá, tinha conseguido a pole-position, e bastava mais uma vitória para ter uma grande chance de alcançar o campeonato. Mas, primeiro, uma carambola com Jones, e depois, um erro na troca do motor, dando a versão de qualificação, mais potente mas menos resistente, fez com que o brasileiro desistisse na volta 23, com o motor rebentado, dando o campeonato a Alan Jones.

Porém, tinham feito uma boa temporada, e a combinação era mesmo  vencedora, algo que a equipa não tinha tido há algum tempo. Na época seguinte, prometiam mais modificações para ser ainda mais competitivo face aos Williams.

Para a temporada de 1981, surgiu o BT49C, numa altura em que Bernie Ecclestone tentou ter na equipa os serviços do americano Rick Mears, um dos pilotos do momento na América. Depois de dois testes, em Paul Ricard e em Riverside, na California, o americano sentiu-se tentado, mas decidiu que iria ficar na CART e correr pela Penske. Assim sendo, continuaram com os serviços de Hector Rebaque, e Piquet ganhou na terceira corrida do ano, na Argentina. Nessa altura, no meio das polémicas entre a FISA e a FOCA por causa dos carros de efeito-solo (a FISA tinha banido as saias nos flancos dos carros, alegando serem “dispositivos móveis”), a Brabham tentou um truque com um mecanismo pneumático, onde os carros ficavam colados ao solo e, depois, eram levantados até aos seis centímetros obrigatórios pelos regulamentos. Com isso, Piquet ganhou o GP de San Marino, em Imola, e regressou às vitórias em Hockenheim, na Alemanha, num duelo a alta velocidade com Alan Jones e um jovem Alain Prost, então piloto da Renault.

Em Las Vegas, palco da última corrida do ano, onde tudo parecia estar a favor de Carlos Reutemann, Piquet fez uma corrida de paciência, esperando por um mau dia do argentino, que acabou por acontecer. Ele ficou sem caixa de velocidades e acabou na oitava posição, sem pontos. O quinto lugar final de Piquet foi suficiente para ganhar o seu primeiro título mundial por apenas um ponto.

Um recurso competitivo

Por esta altura, Ecclestone tinha sentido o lado para onde soprava o vento, e decidiu assinar um acordo para ter motores Turbo. O escolhido acabou por ser a montadora alemã BMW, e em meados de 1980, o acordo foi assinado. O motor, desenvolvido pelo Dr. Paul Rosche, ficou pronto para uma demonstração no GP da Grã-Bretanha de 1981, em Silverstone, mas a sua estreia acabou por acontecer no GP da África do Sul de 1982, com um novo chassis, o BT50. Ao seu lado, Piquet tinha o italiano Riccardo Patrese, vindo da Arrows.

Os resultados em Kyalami desapontaram, e Ecclestone decidiu que iria retirar o BT49 da reforma, com efeito imediato. O carro ganhou no Brasil, com Piquet ao volante, mas acabou por ser desclassificado, por estar abaixo do peso. A BMW ameaçou abandonar a F1 se não fosse usado o seu motor, e ambas as partes decidiram-se por uma solução equitativa: Piquet corria com o motor Turbo, e Patrese com o aspirado. Logo, uma terceira versão do carro, o BT49D foi feito só para o italiano.

O carro ainda mostrou a sua competitividade, com Patrese a conseguir um terceiro lugar em Long Beach, aproveitando a desclassificação de Gilles Villeneuve. Regressou às mãos do italiano no Mónaco, com este a ser protagonista da enorme confusão nas voltas finais do GP monegasco, despistando-se na penúltima volta quando escorregou no óleo do Williams do irlandês Derek Daly, mas regressando à pista para acabar como vencedor… sem que o soubesse de imediato!

Duas corridas depois, em Montreal, Patrese aproveitou a fiabilidade do motor Cosworth para chegar ao fim no segundo lugar, não muito longe do  vencedor, o BT50 de Piquet. Foi a primeira vitória do BMW turbo, mas o chassis antigo, já na sua terceira versão, com mais de dois anos e desenhado inicialmente como um projecto provisório, para um mais pensado num futuro mais adiante, tinha ainda marcado 19 pontos, numa temporada em que deveria estar exposto num museu…

O Brabham BT49 acabou, afinal, por ser dos melhores chassis desta era dos carros-asa, conseguindo sete  vitórias, sete pole-positions, quatro voltas mais rápidas, 16 pódios e 135 pontos, espalhados por três temporadas (1980-82). E claro, o melhor resultado de todos foi o campeonato de pilotos de 1981, com Nelson Piquet ao volante. Em suma, este foi o melhor resultado de um acaso feliz, projectado por um dos maiores arquitectos da história do automobilismo.

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