Arquivos • 05 Out 2024

Depois do sucesso de determinado chassis, espera-se que no mínimo o seu sucessor seja suficientemente conservador em termos de desenho para que possa navegar no sucesso dos anteriores. Contudo, há 50 anos Colin Chapman decidiu que o sucessor do bem sucedido Lotus 72, que deu títulos a Jochen Rindt e Emerson Fittipaldi, e triunfos a Ronnie Peterson, fosse um tão ousado como o anterior. Contudo, acabou por ser um dos maiores fracassos da história da marca e causou um contratempo o qual só se resolveria no final da década, com a entrada em cena do efeito-solo.

Meio século depois da sua estreia, em Jarama, é hora de falar sobre estre contratempo da história da equipa de Hethel.
Asa dupla e quatro pedais
Chapman sempre foi uma personalidade ousada, quer nas suas criações, quer no que toca aos seus pilotos. Adicionar simplicidade e leveza aos seus automóveis sempre foi o seu lema, e em muitos aspectos fora bem sucedido nas suas apostas, pelo menos na última década. Chassis monocoque, apêndices aerodinâmicos, o motor Cosworth, aliado a pilotos como Jim Clark, Graham Hill, Jochen Rindt, Emerson Fittipaldi e Ronnie Peterson, tudo isto foram sinónimos de sucesso na Lotus.

Em 1974, Chapman chegara à conclusão que o modelo 72, em acção desde 1970, já tinha chegado ao final do seu tempo de vida útil. Desde há algum tempo que preparava um modelo mais avançado, que tivesse uma maior distância entre eixos, um monocoque posicionado de forma mais baixa em relação ao centro de gravidade, e também mais algumas novidades que o colocassem à frente da concorrência, e assim, mantivesse a sequência vitoriosa. Foi desta forma que nasceu o modelo 76, e Chapman fez com que fosse o mais radical possível.
Quando foi apresentado, os jornalistas ficaram espantados: uma asa dupla na traseira, montada com a ideia de ter maior downforce e estabilidade na traseira. Por dentro, quatro pedais, sendo um deles uma embraiagem electrónica no sentido de ajudar a operar a caixa de velocidades sem recurso ao pedal. De uma certa forma, um precursor da caixa semiautomática que a Ferrari usaria 15 anos depois. O carro era esteticamente mais limpo, com linhas mais direitas, e os radiadores laterais mais envolvidos no chassis. De uma certa forma, apesar de algumas semelhanças com o modelo anterior, o 76 era bastante diferente.

Mas logo nos primeiros quilómetros de testes, quer Ronnie Peterson, quer o seu companheiro de equipa, o belga Jacky Ickx – que substituira Emerson Fittipaldi no final da temporada anterior, com este a ir para a McLaren – começaram a queixar-se do pedal electrónico, que lhes dava problemas. E a asa traseira não funcionava como queriam, queixando-se assim de não sentirem o automóvel, com desequilíbrios na distribuição de peso.
E foi com esses problemas por resolver que foram para Kyalami, na África do Sul, palco da terceira corrida do campeonato.
Potencial com quebras mecânicas
Na pista sul-africana, as coisas não correram bem. Peterson foi décimo, seis lugares acima de Ickx, mas nos primeiros metros da corrida não se entenderam e acabaram por bater um contra o outro, numa colisão que também envolveu o BRM de Henri Pescarolo e o Iso-Marlboro de Tom Belsø. O sueco desistiu na segunda volta e o belga continuou, mas acabou por abandonar na 31ª volta, com problemas nos travões. Apesar destes contratempos, eles acreditavam que as coisas melhorariam na corrida seguinte, em Jarama, no GP de Espanha.

E tal até aconteceu, pelo menos… nos treinos. Peterson quase conseguiu a pole position, mas foi batido pelo Ferrari de Niki Lauda, ficando três décimos mais rápido. Ickx foi quinto, não muito longe deles. No dia da corrida, Peterson largou melhor e aproveitou o mau tempo para se manter na liderança, lá ficando até à 20ª volta. Entretanto, a chuva parou e a pista começou a secar, com os pilotos a irem às boxes, trocando para slicks. Ickx chegou a ficar com a liderança, mas a meio da corrida ambos os carros já tinham abandonado: Peterson na volta 23, por causa do motor, e o belga na 26, por causa dos travões.
Em Nivelles, palco do GP belga, as performances na qualificação foram um pouco piores. Se Peterson foi quinto, não muito longe dos primeiros, já Ickx não foi além de 16º, bem pior. No princípio, Peterson acompanhou os primeiros, e Ickx começou a recuperar posições no pelotão, mas depois os problemas vieram à tona, parando nas boxes para tentar resolver questões como fugas de óleo e sangramento dos travões. Não foram longe e as suas corridas acabaram na volta 56 para o sueco, e na 72ª para o belga, por causa dos travões.

Três corridas, três desistências. Algo tinha de ser feito para salvar o projecto e Chapman decidiu que iria retirar o chassis para ser redesenhado. Até lá, o 72 era retirado da garagem, e os resultados foram imediatos: Peterson triunfou no Mónaco e, no início de Julho, em Dijon, no GP de França, com três voltas mais rápidas pelo caminho.
Emendas e correções
O automóvel foi modificado nos sidepods, para um melhor arrefecimento, e no final de julho, no GP da Alemanha, no Nürburgring Nordschleife, Peterson deu-se bem: quinto na grelha, acabou a corrida na quarta posição. Iriam ser os únicos pontos que o carro iria conseguir. Ickx iria ainda ficar com o carro nas duas corridas seguintes, na Áustria e em Itália, mas as prestações nas qualificações foram más e na corrida não foi longe, com uma colisão com Patrick Depailler no Österreichring, e na pista italiana, um problema no acelerador obrigou-o a parar na 30ª volta.

Ambos decidiram regressar ao 72, que já acusava a idade, mas o 76 foi usado mais uma vez, na última corrida do ano, em Watkins Glen. O escolhido foi o australiano Tim Schenken.
A falta de adaptação do australiano à máquina fez com que fosse 27º e antepenúltimo, não se qualificando. Contudo, acabou por largar ilegalmente, e os comissários decidiram desqualificá-lo, após sete voltas.
No final, Chapman chegou à conclusão que este projecto era demasiado complicado para os pilotos, e demasiado problemático para poder ser resolvido para poder ser aproveitado todo o seu potencial.