GP Argentina 1974: Uma volta bastou

Competição 01 Fev 2024

GP Argentina 1974: Uma volta bastou

Por Paulo Alexandre Teixeira

Para ganhar, basta estar na frente quando mostrarem a bandeira de meta. Apenas isso. Nem é preciso estar a liderar desde o primeiro metro, apenas temos que ser o primeiro no último, na linha de chegada. Até lá, podemo-nos dar ao luxo de até estar atrás do primeiro classificado, o que conta é estar presente quando este tem algum problema.

E foi o que aconteceu a Dennis Hulme a 13 de Janeiro de 1974, na primeira corrida da temporada, na Argentina. Três meses depois da última da temporada anterior, em Watkins Glen, a Fórmula 1 tinha-se transformado: Jackie Stewart tinha ido embora, Francois Cevért estava morto, Emerson Fittipaldi tinha ido para a McLaren e secundar Hulme, e no seu lugar foi Jacky Ickx, depois de meio ano a vaguear por McLaren e Iso-Marlboro, e a Tyrrell encheu a sua equipa de jovens lobos, o sul-africano Jody Scheckter e o francês Patrick Depailler, para dar sangue novo à equipa. E na Shadow, equipa anglo-americana, refugiava-se o americano Peter Revson, vindo da McLaren.

E a Ferrari também decidira agitar as águas, depois de uma revolução de alto a baixo,que Enzo Ferrari estava disposto a fazer. Não só em termos de pilotos – Clay Regazzoni regressou da BRM e trouxe consigo um austríaco de seu nome Niki Lauda – como aceitou uma sugestão da Fiat, de acolher um jovem engenheiro de 25 anos, de seu nome Luca Cordero di Montezemolo.

Com tudo isso, todos apanhavam sol e calor no verão austral de Buenos Aires, numa corrida onde todos os olhos estavam postos no piloto local, Carlos Reutemann, que corria no seu Brabham, e estreava o seu novo carro. Partindo de sexto, numa qualificação ganha por Ronnie Peterson, no seu Lotus, aproveitou bem a carambola na primeira volta para ser segundo e atacar o sueco da Lotus. Na terceira volta, ficava com o comando, para delírio dos fãs locais, que não viam ninguém ganhar desde os tempos de Juan Manuel Fangio, que estava ali para dar a bandeira de xadrez. E entre os fãs, nada mais, nada menos que um muito importante: Juan Domingo Peron, o presidente da Argentina.

Com Reutemann a controlar a situação, parecia que os locais começavam a acreditar que poderiam comemorar. O Brabham – que estreava ali o seu modelo BT44 – mostrava ser competitivo, e à medida que as voltas passavam não só se mantinha na frente, como estava até a ir embora. E quando alguns dos favoritos desistiram – James Hunt, na volta 11, Jody Scheckter, na 25, Jacky Ickx na 36, ao mesmo tempo que Ronnie Peterson (travões) e Emerson Fittipaldi (problema numa vela) se atrasavam, então os argentinos começaram a acreditar. Ao ponto do próprio Peron ter decidido, à última hora, comparecer no pódio para entregar o troféu de vencedor a Reutemann.

Contudo, o que ninguém sabia era que ele tinha um problema. A sua entrada de ar atrás do seu capacete tinha quebrado e aquilo bloqueava o ar necessário para manter o motor fresco. E pior: consumia mais combustível que o necessário, ou seja, corria o risco de não chegar à meta. Contudo, Reutemann decidiu confiar na sorte, e nas voltas finais… começou o drama. Com o carro a falhar, porque a gasolina começava a chegar à reserva, Hulme, o segundo classificado, depois de na corrida ter andado em duelo com Ickx, e superado os Ferrari, soube dos problemas de Reutemann e começou a aproximar-se. 

E foi nessa altura que “El Presidente” decidiu caminhar para o pódio, desconhecendo os problemas do seu compatriota. Enquanto caminhava por debaixo de tribunas e túneis, Reutemann era passado por Hulme, no inicio da penúltima volta, e Reutemann parava, sem gota de combustível, perante a desilusão dos fãs locais. Peron, avisado do imbróglio, deu meia volta, afinal de contas, poderia entregar o troféu a um estrangeiro!

No final, Hulme, o campeão de 1967, comemorava a sua primeira vitória em meio ano, e a terceira do chassis M23, mas a grande novidade eram os Ferrari de Regazzoni e Lauda, o primeiro pódio duplo da Scuderia desde o GP da Alemanha de 1972 – símbolo de que a aposta radical nos novos tempos e nas novas mentalidades começava a resultar.

No final, a corrida ficou para a história como a da última vitória para o “urso” neozelandês e o último de alguém desse país, e também o primeiro dos 54 pódios que o piloto austríaco iria conseguir na sua carreira na Formula 1.

Quanto ao argentino… ninguém sabia, mas duas coisas iriam acontecer. A primeira, que ele nunca iria ganhar a sua corrida natal. Mas a segunda era que o seu momento de glória iria acontecer dentro em breve.

Classificados

Siga-nos nas Redes Sociais

FacebookInstagramYoutube