Clássicos • 15 Mar 2015
Empresário compra rara colecção de superdesportivos clássicos
Por Pedro Fernandes
Fantasma de um futuro não concretizado para a TVR, o Trident Clipper definiu-se como um pequeno automóvel desportivos de grandes possibilidades, mas limitado aquém do seu potencial. A Trident Cars Ltd. foi uma companhia automóvel de Suffolk que embarcou na popular tendência durante a década de 70, da criação de híbridos; nesse período, a designação “híbrido” ainda não detinha conotação com automóveis de motorização eléctrica e combustão interna, aplicando-se sim a modelos europeus com motores norte-americanos, estabelecendo um emocionante mas derradeiramente atribulado casamento entre a proficiência estética do velho continente e os V8 musculados do outro lado do Atlântico.
A história do Clipper, o primeiro modelo da Trident Cars, começou com a mítica TVR de Trevor Wilkinson. Em 1964, Wilkinson encarregou Trevor Frost de traçar um novo automóvel. Frost, Designer-chefe na Fissore, pai do radical concept Karin da Citroën, do De Tomaso Vallelunga e do Alpine A310, criou então um fastback sóbrio mas elegante, muito ao gosto italiano, com predominância de linhas rectas e traseira dominada por um enorme vidro enquadrado em pilares finos, características que viriam, aliás, a dominar a linguagem de design da Maserati ao longo de inícios e meados da década de 70. Designado “Trident”, o automóvel escondia sob o capot um motor Ford de 4.7 litros.
Acabariam por ser construídos quatro Trident: três coupés e um descapotável. Os automóveis foram apresentados no Salão de Genebra em 1965, sendo bem recebidos pelo público e pela imprensa. Contudo, a TVR atravessava dificuldades financeiras, as quais se expressaram de modo tão afirmado que acabaram mesmo por falir a companhia. A maioria do espólio da TVR foi então adquirido por um revendedor da marca, Martin Lilley. Apesar deste facto, os direitos de construção do Trident foram excluídos ao referido espólio e vendidos separadamente, tendo acabado nas mãos de outro ex-representante da TVR, William Last, o qual estabeleceu uma nova empresa em redor desses mesmos direitos: a referida Trident Cars.
Ao contrário dos concept originais, com carroçarias em aço e capots em alumínio, para a nova série de Clippers de produção, a Trident substituiu tudo pelo material de eleição da TVR: a fibra de vidro. William Last contatou Frost, encarregando-o de efetuar algumas alterações ao seu design original. Os faróis pop-up foram substituídos por um layout mais tradicional (dir-se-ia até, antiquado) e muito menos apelativo, semelhante ao do Ford Corsair, com ópticas embutidas em recortes que acompanhavam as linhas do guarda-lamas e do capot; o perfil manteve-se, mas a traseira foi também alvo de mudanças, trocando farolins semi-embutidos em recortes dramáticos (entretanto eliminados), por unidades sobressaídas oriundas do Austin 1800, que abraçavam os vértices laterais da traseira.
Ao contrário dos concepts Trident, com carroçarias sobre chassis de TVR Griffiths, os Clipper assentavam sobre chassis de Austins Healey 3000. Em 1969, é introduzido o Trident Venturer, equipado com o V6 Essex da Ford e com base no Triumph TR6. Até a este ponto, pelo que é sabido, apenas 39 Clippers teriam sido fabricados, aos quais viriam a juntar-se 84 Venturers. Em 1976, uma última variante do Clipper designada Tycoon, com um aspecto controverso, limitado pelos grandes pára-choques de borracha para ir ao encontro das regulações para o mercado americano e motorização do TR6 – seis cilindros em linha, 2.5 litros -, acabou por consistir apenas de sete automóveis.
À distância, a identificação visual de Clipper e Venturer é bastante difícil, sendo um desafio mais sensatamente deixado aos verdadeiros entusiastas destes modelos, já que as variantes estilísticas e uso de componentes externos aparentam não obedecer a qualquer regra ou razão. Perspetivando a dianteira, o Clipper surgiu com os já referidos recortes em redor das ópticas, mas também com estas cobertas por simples painéis acrílicos ou por painéis curvilíneos que constituíam uma extensão das próprias linhas da carroçaria. Para o Ventuer, o aspecto do automóvel reverte a algo mais próximo do que Trevor Frost inicialmente traçara. Embora sem regresso dos faróis pop-up, foi reposta a integridade das linhas rectas dos concepts à frente do Venturer, utilizando inicialmente ópticas do Austin Allegro (?), depois substituídas por unidades duplas reminiscentes das séries mais tardias do Bristol 411 e do Ogle Mini, surgindo ainda variantes com semelhanças ao Jensen Interceptor III e ao Reliant Scimitar GTE. Todo este bric-à-brac estilístico seria, contudo, utilizado de modo aparentemente aleatório entre Clipper, Venturer e até Typhoon, com características dos Clipper aplicadas aos Venturer e vice-versa, carroçarias Venturer em chassis com motorizações do Clipper, em suma, um caos fascinante reservado a automóveis de produção limitada que, sem qualquer sentido desfavorável, podem ser considerados como interessantes exemplos de parts-bin specials, embora seja inegável que a falta de particularidade e distinção afectaram certamente a percepção do público acerca destas criações.
Apesar do referido, a reciclagem de peças e de estilos não significava que os Trident fossem baratos, ou sequer acessíveis. Aliás, em 1972, o preço listado de 3.999 libras significava que o Clipper era mais dispendioso que o E-Type 2+2. Assim, o preço elevado dos automóveis Trident aliado as dificuldades inerentes à crise petrolífera de 1973 ditaram o fim da companhia, no ano seguinte.
Actualmente, em excelentes condições, um Trident Clipper exigirá, no Reino Unido, o equivalente a 30.000 -35.000€, os Venturer em condições semelhantes encontrar-se-ão disponíveis com valores próximos aos 17.000€.
Créditos das imagens: Hagerty; Historics Auctioneers; Car and Classic; Autocar; Practical Classics
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