Clássicos • 28 Out 2013
Um dos maiores pesadelos dos aficionados do antigomobilismo brasileiro tornou-se realidade em 2009: a preciosa coleção de carros antigos do Museu de Tecnologia da Ulbra, em Canoas, no Rio Grande do Sul, acabou retalhada e levada a leilão.
Um acordo entre a Comunidade Evangélica Luterana São Paulo (Celsp), mantenedora da Ulbra à época, a Fazenda Nacional e a Justiça Federal selou irremediavelmente o destino do fantástico museu gaúcho. Antes mesmo do primeiro leilão, a General Motors já havia recolhido 70 veículos que cedia à Universidade em regime de comodato. Foi o começo do fim.
Sim, as dívidas de mais de R$ 1 bilhão deixadas pela desastrada direção anterior da Universidade tinham de ser pagas. Tributos tinham de ser recolhidos aos cofres públicos. Professores tinham de receber salários. Alunos não podiam ficar sem aulas. Mas o fatiamento do acervo do Museu da Ulbra foi mais uma brutal demonstração do descaso da sociedade brasileira para com um patrimônio de grande valor histórico e cultural.
As jóias sobre rodas que podiam ser democraticamente admiradas por todos estão hoje guardadas a sete chaves em garagens particulares e são desfrutadas por meia dúzia de privilegiados que puderam pagar, por exemplo, R$ 250 mil por um Rolls Royce Limousine 1956 – uma das peças mais vistosas da coleção.
Com um acervo de mais de 270 veículos clássicos construídos a partir de 1904 (sem contar outros tantos em suas oficinas de restauração), instalado em um belíssimo prédio de aço e vidro de 9.346 m2 no campus de Canoas, o Museu da Ulbra chegou a ser considerado por especialistas um dos dez melhores do gênero no mundo. Era, seguramente, o melhor da América Latina. Um patrimônio da indústria automobilística mundial. Não poderia ter sido responsabilizado pela crise que abalou a Universidade. Nem merecia ser esquartejado para pagamento de dívidas. A Universidade e seus antigos gestores possuíam bens imóveis mais valiosos, e o montante apurado com os leilões quitou uma ínfima parcela da dívida.
O Brasil é carente de museus que preservam a história da tecnologia. Com o triste fim do Museu de Tecnologia da Ulbra, ficou ainda mais pobre.
Irineu Guarnier Filho é brasileiro, jornalista especializado em agronegócios e vinhos, e um entusiasta do mundo automóvel. Trabalhou 16 anos num canal de televisão filiado à Rede Globo. Actualmente colabora com algumas publicações brasileiras, como a Plant Project e a Vinho Magazine. Como antigomobilista já escreveu sobre automóveis clássicos para blogues e revistas brasileiras, restaurou e coleccionou automóveis antigos.