Toivonen e Bettega, ou a maldição do nº4

Arquivos 02 Mai 2013

Toivonen e Bettega, ou a maldição do nº4

Se o 1º de maio de 1994 será sempre recordado pelos adeptos do automobilismo, o dia 2, também, numa escala diferente mas não menos importante, já que essa foi a data em que Attilio Bettega, Henri Toivonen e Sergio Cresto morreram ao serviço da sua paixão, os ralis.

Foi nos primeiros quilómetros da especial de Zerubia-Santa Giulia, a quarta do “Tour de Corse”, que Attilio Bettega se despistou. Quase três décadas depois, a importância dos pneus no desporto automóvel não se alterou e foi devido ao facto dos responsáveis da Lancia terem optado por montar pneus duros nos 037 de Markku Alen, Miki Biasion e Attilio Bettega, que, supostamente, iriam suportar o piso abrasivo dos 31 quilómetros da especial e dessa forma, bater o Renault 5 Maxi Turbo de Jean Ragnotti, dominador da prova. O problema é que até os pneus aquecerem e atingirem a temperatura ideal, pareciam manteiga a derreter.

Antes do início do troço, Bettega dizia: “Se não ganhar aqui, não ganho em lado nenhum!” o Italiano era um forte especialista do Rali da Córsega, e nem o terrível acidente que foi vítima em 1982, que o mandou seis meses para o Hospital, o abanava. Depois de regressar, uma série de acidentes marcou a sua carreira, na Sardenha e Costa Esmeralda, e infelizmente, como todos sabemos, essa série teve o seu epílogo na Córsega.

Antes da prova, palavras como “Desta vez é a vitória ou nada!” pareciam somente de auto motivação, e mostravam uma grande confiança nas suas capacidades. Mas afinal era uma premonição! Tudo ou nada! Pouco depois do início da quarta especial, existia uma grande curva à direita, a descer, que se abordava a cerca de 150 km/h. Na curva anterior, o italiano saia com uma trajetória um pouco larga, e as rodas do lado esquerdo ‘morderam’ as pequenas pedras plantadas na berma. Quis o destino que uma pedra um pouco maior desviasse o Lancia 037 Rally da sua trajetória o que levou Bettega a ‘perder’ o volante por instantes, que se revelaram fatídicos, pois já não foi a tempo de ‘agarrar’ o carro, cujos pneus também não ajudaram, pois naquela fase da especial ainda não estariam no pleno da aderência. O Lancia fez meio pião a alta velocidade, batendo em várias árvores, do lado do piloto. O ‘espetáculo’ que se seguiu foi, minutos depois, testemunhado por Miki Biasion, Bernard Béguin e François Chatriot, que pararam, e pouco depois dirigiram-se para o final da especial, depois de perceber que nada havia a fazer.

Maurizio Perissinot, o seu navegador, contou o que aconteceu: “Fizemos a direita sem grandes problemas, já tinha ditado a pequena reta e as duas curvas que se seguiam, quando percebi que se passava algo. Levantei os olhos das notas e só vi árvores na minha frente.” O Lancia 037 Rally deixou a estrada a velocidade elevada, entrando pelas árvores que ladeavam a berma; o embate nestas foi fortíssimo, do lado de Bettega e o tejadilho, bem como o “roll bar”, não resistiram, tendo o piloto sofrido morte instantânea, devido aos ferimentos na cabeça. Ironicamente, três anos antes, no mesmo rali, Bettega tinha já sofrido um violento acidente, ao embater numa ponte, fraturando em diversos locais os membros inferiores, mas sobrevivendo. Maurizio Perissinot era, também nessa altura, o seu navegador.

Eram 11h04m da manhã quando a especial foi interrompida, minutos antes tinha perdido a vida Attilio Bettega, aos 32 anos. A exemplo do que sucedeu com tantos outros pilotos que perderam a vida depois de noutras fases das suas carreiras terem tido acidentes graves, também Attilio Bettega acabou por morrer depois de vários acidentes graves.

Um ano depois, Toivonen e Cresto…

… voltavam a lançar a maldição sobre o Lancia com o número quatro. Henri Toivonen pode não ter sido o arquétipo do “finlandês voador”, pois normalmente quem se associa a esta expressão são pilotos mais velhos, como Timo Makinen, Ari Vatanen ou Markku Alen. Porém, não devia a ninguém em termos de capacidade de rodar sempre a fundo, quanto a coragem e disponibilidade. Para ele, apenas havia uma forma de pilotar: de pé em baixo.

As suas passagens pelas estradas de Sintra, pulverizando todos os recordes, ainda hoje se encontram na memória de todos os amantes verdadeiros de ralis. A sua morte horrível, queimado dentro do Lancia Delta S4, lado a lado com o seu navegador, Sérgio Cresto, precipitaram o final dos monstruosos devoradores de asfalto, que eram os Grupo B.

Entrevistado recentemente, Cesare Fiorio, manager da Lancia Martini na altura, não conseguiu esconder as lágrimas ao falar de Henri Toivonen, que para si era como um filho. Um talento que se perdeu na enorme loucura que foram os Grupos B.

Texto: Autosport/JLA

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