Lambretta Rosso Corsa

LifeStyle 27 Mar 2013

Lambretta Rosso Corsa

A máquina infernal

Pensar na Lambretta como tendo prestações demoníacas é algo que somente um restrito número de entusiastas consegue.

Imagine juntar o saber de um campeão de motociclismo da década de 50, a um arrojado projectista do novo milénio, cujos traços são bastante extravagantes, mas ao mesmo tempo convencionais e tente adivinhar o resultado final.

Sabemos que este artigo vai contra todos os ideais de purismo, tradição e linhas originais. Sabemos disso, mas não nos importamos nada em ir “contra-a-corrente” que defende que somente os veículos originalmente saídos de fábrica nos importam. Rasgamos os nossos horizontes e o convencional e mostramos-lhe hoje um projecto teórico que cresceu, desenvolveu-se, amadureceu e viu finalmente a luz do dia. Tudo apenas com um único motivo por trás: a paixão por uma marca.

A Lambretta esteve desde sempre ligada ao universo das scooters, mas longe vai o ano de 1947, quando a Innocenti apresentou o modelo A. Na altura o objectivo era apenas o de oferecer um meio de transporte fácil de utilizar e de manutenção básica. Mas tal como tudo o que tem motor e rodas – e nasce em Itália – o fenómeno depressa cresceu e o interesse pela competição desenvolveu-se sob as mais diversas formas. Passados apenas dois anos após a apresentação do modelo pioneiro da casa italiana, já havia uma enorme legião de adeptos a alinharem em competição aos comandos da famosa Lambretta. Isso veio a constatar-se ao longo de toda a história do construtor de Milão, primeiro com pilotos particulares, depois com a entrada da própria fábrica em competições oficiais, fosse em provas de velocidade em circuito, recordes de velocidade pura ou mesmo provas fora de estrada.

Portugal não fugiu a esta regra e talvez um dos nomes mais marcantes de sempre associado à Lambretta tenha sido Alfredo Baptista Rodrigues. Depois de se ter iniciado no desporto motorizado em 1954 no motocross com uma BSA de 250cc, o piloto passou para as corridas reservadas a scooters. Estas provas estavam bastante na moda no início da década de 60 e finais dos anos 50 e clubes como o Sporting Clube de Portugal, o Sport Lisboa e Benfica e mesmo o Clube 100 à Hora eram apenas alguns dos organizadores de grandes provas desportivas motorizadas que atraiam verdadeiras multidões. Alfredo Baptista Rodrigues cedo começou a dar nas vistas aos comandos de uma Lambretta 125, tendo ganho provas como a Volta a Portugal e ter assinado uma excelente prestação no Lisboa-Porto-Lisboa, sendo que estas últimas corridas foram já disputadas quando era piloto oficial da Lambretta. Mais tarde, Baptista Rodrigues ligou-se à marca Gilera, uma vez que a firma Moto Lambretta Portuguesa, Lda era representante das duas marcas.

Mas o coração de Alfredo Baptista Rodrigues continuou a estar ligado à marca criada por Inocentti e bastantes anos mais tarde, ele foi um dos grandes responsáveis pela criação do Lambretta Clube de Portugal. É aí que conhece Tomás Da Costa Lima, um entusiasta da marca que sonhava em construir uma Lambretta “diferente de todas as outras que havia por cá.”

Nasce o projecto

Tomás Da Costa Lima começou a pressionar Alfredo Baptista Rodrigues pouco anos tempo antes de 1998. Ia mesmo várias vezes a Belém, onde Alfredo Baptista Rodrigues tinha o seu negócio de barcos e as suas motos de eleição, para o tentar convencer a avançar com o projecto. Refira-se que o projecto nesta altura era mesmo projecto, no papel e tudo, e talvez tenha sido o entusiasmo de Tomás Lima e a sua maquete da futura Lambretta que tenha despertado a mente aguçada de Alfredo Baptista Rodrigues que passado pouco tempo depois resolveu meter mãos à obra.

As tarefas para o desenvolvimento do arrojado projecto estavam assim lançadas: Tomás Lima encarregava-se da parte estética, enquanto Baptista Rodrigues ficava responsável pela parte técnica da mais arrojada Lambretta existente em Portugal. Para isso, encomendaram vário material de Inglaterra, um país onde o culto das scooters e das transformações estava a um nível bastante elevado (hoje em dia talvez tenha sido ultrapassado pela Alemanha). “Uma das fontes inspiradoras para a realização do trabalho estético, foi sem sombra de dúvidas a revista inglesa Scootering da época”, revelou-nos Tomás Lima, numa das várias entrevistas que nos concedeu. Outro aspecto que o nosso interlocutor fez questão de realçar foi a ideia de que tudo o que ele e Alfredo Baptista Rodrigues fizeram não foi mais do que conceber um verdadeiro protótipo que continua em constante mutação…até aos dias de hoje. Porque? Já vão perceber….

A concepção

Depois do projecto ter tomado o seu primeiro passo e o material encomendado ter chegado a Lisboa, era altura de começar a “meter mãos à obra”.

Para isso foram necessárias três Lambrettas construídas entre os anos de 1963 e 67. O chassis escolhido para o protótipo foi o de uma Lambretta 150 DL, enquanto que da Li, retirou-se o farol da frente, bem como o guiador e as tampas laterais, sendo que este último item serviu também para fazer as tampas do depósito de combustível. Da mais moderna SX200 veio o garfo da frente e o avental da frente era proveniente de uma Luna. Quanto ao motor utilizado, a base era de um bloco de uma Lambretta fabricada em Espanha. Estas máquinas receberam a designação de Servetta e a escolhido foi uma das unidades propulsores fabricadas com 200 cc de capacidade. Todo o restante material foi fabricado propositadamente para o protótipo.

Mas vamos por partes. O guiador foi encurtado e recebeu uma bomba de travão da frente hidráulico. De referir que os dois amortecedores de direcção eram provenientes de uma Suzuki. Quanto ao pára-lamas, este foi criado de raiz para esta Lambretta. E já que estamos aqui a falar do trem da frente, realce para a jante 10, que veio de Inglaterra, o mesmo acontecendo cm o pneu Pirelli SL 38 de medidas 120/ 70 /10. O travão da frente é hidráulico, tendo sido enviado um normal para Inglaterra e devolvido um já transformado. Já o avental da frente, proveniente de uma Luna, foi cortado e perfurado de modo a arrefecer o radiador.

O estrado é em alumínio, enquanto na traseira desta Lambretta foi colocada uma peça em fibra de vidro com uma estrutura móvel, capaz de possibilitar o acesso ao depósito de combustível e ao motor. Quanto à suspensão traseira, Alfredo Baptista Rodrigues debateu-se com alguns contratempos, uma vez que se teve que fabricar três tipos de mola até acertarem com o que actualmente está montado nesta máquina. De referir que este é regulável, uma vez que é um amortecedor a gás. Foi feito em Portugal, pela APV – Amortecedor Português para Veículos, Lda, em Vila Franca de Xira.

O veio do sinobloco foi aumentado de modo a poder receber dois sinoblocos para se conseguir uma maior rigidez.

Outro item bastante importante a ter em conta era o escape, já que com este componente, a Lambretta poderia melhorar significada mente o seu desempenho. Numa primeira fase, este foi instalado do lado direito do motor, mas como atrapalhava quando se accionava o motor com o pedal de kick, Tomás Lima e Alfredo Rodrigues optaram por colocá-lo a sair pelo lado esquerdo. Outro aspecto que poderia ter sido diferente e que foi devidamente testado foi o travão de trás. Se agora este sistema de travagem é de tambor, a verdade é que Alfredo Rodrigues chegou a tentar montar um travão de disco. Porém, esta ideia foi abandonada, já que além do técnico não conseguir montar as pinças do travão, a verdade é que a scooter, enquanto conjunto, ficava inestético e demasiado longo.

Uma peça de arte no autódromo

O projecto iniciado por Alfredo Baptista Rodrigues e Tomás Da Costa Lima viu finalmente a luz do dia passados cerca de três anos.

Entretanto, Alfredo Baptista Rodrigues faleceu e Tomás Da Costa Lima viu-se a braços para terminar o ambicioso projecto, apesar deste estar praticamente concluído. Valeu-lhe a sabedoria de António Costa que realizou uma pré-revisão, uma manutenção e os últimos retoques. No entanto, apesar de uma breve volta de poucos quilómetros, Tomás Lima foi obrigado a colocar a Lambretta no seu atelier, encurralada num 3º andar no Cais do Sodré. Só que ao mesmo tempo que servia de inspiração para outros arrojados projectos, a Lambretta pintada na cor Rosso Corsa, “pedia” por alcatrão. E assim foi. Depois de uma sessão fotográfica em estúdio, Tomás Lima decidiu que era altura de explorar as potencialidades da “sua” máquina. Por ironia do destino, o Vespa Clube de Lisboa levou uma comitiva a dar duas voltas ao Autódromo do Estoril, integrado nas provas do Troféu Nacional de Motos Clássicas. A ocasião não podia ser melhor e depois de se ter tirado a Lambretta de um terceiro andar sem elevador, chegou finalmente a hora de colocar a macchina di corsa em funcionamento num palco de excelência. Com a sensação de um miúdo que iria testar finalmente o seu brinquedo, Tomás Lima optou por refrear a sua ânsia e adoptar um andamento moderado, não fosse o protótipo ainda ter alguns problemas de juventude. Após acomodar o depósito de combustível de forma apropriada, e depois de algumas “patadas” no pedal de kick, o motor com 35 bhp deu sinal de si, atraindo por completo as atenções de todos aqueles que estavam no autódromo do Estoril em dia de corridas. Arriscamos mesmo a dizer que a Lambretta cativou mais atenções do que as Yamaha TZ ali presentes. No final do dia, Tomás da Costa Lima revelava-nos com um sorriso de orelha a orelha: “é impressionante o que isto anda. No fundo, são cerca de 35 bhp para cerca de 70Kg, o que se revela num enorme sensação de condução. A partir das 4.000 rpm, o motor não pára de evoluir e deixa-se de ter a sensação que estou em cima de uma scooter. Penso que terei andado na casa dos 140-150 km/h no final da recta e nem forcei o andamento, pois como este é um trabalho inacabado, facilmente poderia deitar tudo a perder, caso corresse algum imprevisto. É de facto alucinante esta Lambretta e aposto como o Alfredo gostaria de estar aqui para experimentar a sua máquina.”

Texto e Imagens: TCA/ Classic Press Center©

Características técnicas

Motor: TS1 mono cilindro com 225 cc de capacidade, com lamelas e cabeça de alta compressão;

Refrigeração: ar e água, através de bomba eléctrica;

Carburador: Dellorto 34mm;

Caixa de velocidades: 4;

Embraiagem: 5 molas reforçadas;

Travão: frente – hidráulico; trás – tambor;

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1 Comentário
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claudemir destefano bombarda
claudemir destefano bombarda
11 anos atrás

parabens pela lambreta sou um apaichonado pelas lambretas ja corri com uma delas nos anos 70 estou montando outra logo colocarei na intrernet parabens

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