Suzuki GT750, a última grande

Clássicos 11 Mai 2012

Suzuki GT750, a última grande “dois tempos”

Lançada em 1972 e comercializada até 1977, a Suzuki GT750 seria a última dois tempos de grande capacidade a ser oferecida ao público. O motor refrigerado a líquido granjeou-lhe a alcunha afectuosa de “kettle” (chaleira) em Inglaterra e Water Buffalo nos EUA, embora a designação oficial do modelo fosse Le Mans. Porta-estandarte da gama de três dois tempos que incluía a GT380 e GT550, o modelo de maior capacidade tornou-se referencial tanto em potência como suavidade silencio de funcionamento.

O facto de não existir um equivalente nos nossos dias, será sem dúvida uma das razões pela qual estas motos são tão apreciadas por coleccionadores.

Uma arquitetura curiosa…

3 cilindros em linha, 738cc de capacidade, 3 carburadores CV, quatro escapes como era de rigor na época, e imensos cromados e tampas polidas. Em versão de competição, a Suzuki GT750 atingia quase os 290 Km/h em Daytona, granjeando legiões de fans ao modelo de estrada.

A versão J original ainda era fornecida com um travão de tambor de duas “sapatas” duplas de 200mm, pormenor que a identifica imediatamente, bem como tampas laterais do radiador da cor do modelo, cromadas nas séries posteriores. Radiador com ventoinha, carburadores Mikuni VM32Sc de guilhotina e escapes que acabam em cones negros definiam o estilo do modelo. O escape era um “três para 4”. Os cilindros exteriores acabavam, cada um, numa panela cromada, sendo que o do meio se dividia em dois menores, debaixo de cada um dos outros. Todos curvavam graciosamente para cima e os escapes dos cilindros exteriores eram unidos entre si por tubos. A ideia por detrás desta curiosa arquitetura era ajudar a suavizar a resposta à custa do sacrifício de alguma potência, que mesmo assim atingia os 72 cavalos.

Impressionante era o binário que este motor produzia: 7,7 kg às 5.500 rpm. Nada mau considerando a tendência natural dos motores a dois tempos para uma resposta “pontuda”. A cambota apoiava-se em 4 rolamentos, com ordem de disparo a 120º, e os três platinados eram localizados do lado esquerdo do largo motor, tão largo como uma quatro cilindros na zona da cambota. O terceiro cilindro era mais afastado que os outros, para acomodar a transmissão primária. O cilindro, cárteres e cabeça são em alumínio polido, e a saída do líquido refrigerante faz-se no topo. Os pistões de dois segmentos eram virtualmente idênticos aos da T500, suportados em rolamentos de agulha. O termóstato abre aos 82º, e a ventoinha dispara teoricamente aos 105º, mas de facto acabou por ser dispensada em modelos posteriores por quase nunca entrar em acção. O motor é agarrado ao quadro com pontos revestidos a borracha, dissipando as poucas vibrações existentes. As faces dos instrumentos eram planas, e os piscas traseiros encarnados.

O consumo de cerca de 8 litros aos 100 era considerado bom para uma 750, fosse a dois tempos ou não.

A GT750 era quase tão pesada como a CB750 da Honda, tornando-se no entanto mais leve em condução pela ausência de distribuição no topo do motor. Os amortecedores a gás tinham 5 posições de pré-carga. As escolhas de cores distintivas, a começar pelo magenta, ajudaram a distinguir o modelo, com dourados, laranjas, negros, prateados, vermelho e azul metálico – talvez a cor mais popular.

Basta um aflorar do botão de starter da GT750 e o motor de três cilindros desperta com um borbulhar urgente e único no mundo da motos. Longe do raspar raivoso das algo semelhantes Kawasaki da época, e a mais de uma década da Yamaha RD500 ou Suzuki RG Gamma, o motor refrigerado a água, que por isso apresenta um aspecto muito particular com o seu grande cilindro liso e polido, é suave no trabalhar e ainda mais em condução. Um toque numa caixa que, pelos vistos, já nas Suzuki da época era de suavidade referencial, apaga a luz do neutro e acende, entre os dois relógios analógicos, o número da mudança seleccionada no indicador digital – um detalhe que muitos fundamentalistas da época consideravam derrisório mas não deixa de ser um toque refinado. Uma embraiagem algo dura mas linear passa o movimento às rodas, colocando-nos em movimento numa posição estranhamente elevada e muito erecta, graças aos guiadores largos. Alguns utilizadores mais determinados em explorar o lado desportivo da GT750 não tardaram a substituir esses guiadores largos por avanços.

… para uma utilização suave

Rodar o punho produz uma aceleração muito linear, não se discernindo através da rotação qualquer pico, embora a subida se torne mais urgente, vertiginosa até, lá pelas 5 mil até ao redline teórico de 7000 rpm. Porém, se rodarmos o punho bruscamente, tudo acontece então muito depressa e começamos a dar-nos conta do que representa ter uma moto de 750cc a dois tempos debaixo de nós. Felizmente, a compostura do conjunto é boa, a moto entra em curva com grande neutralidade e aliás a impressão que fica é dum grande desfasamento para os modelos actuais entre as prestações do motor e o resto da moto. Em aceleração o motor da GT750 pouco perderia para uma 600 actual, até perto dos 180 Km/h, o que não é dizer pouco se considerarmos o défice de cerca 50 cavalos.

A grande diferença encontra-se, no entanto, nos travões: os dois discos de 295 mm e sapata traseira, continuam a ser da variedade “abrandadora”. A falta de mordida do disco duplo é aflitiva, mesmo com pressão da mão acima do normal, comparando com os actuais sistemas. Só se começa a sentir o seu efeito quando a pressão da mão é elevado e mantida por bastante tempo. Em piso molhado, com os rotores de inox sem perfurações, o cenário será ainda pior. De resto, é um facto que a moto se sente muito leve em condução, mostrando bem que, com 214 quilos, pesa bastante menos que os 235 Kg da Honda CB750, sua contemporânea.

Dotada de um selim confortável, amplo e algo duro, proporciona uma posição de condução generosa e algo relaxante, não havendo dúvidas de que a pérola do conjunto é o seu motor. A suavidade e relativa ausência de ruído conferidas pela refrigeração líquida são notáveis, mas não escondem o grito do escape à medida que as rotações sobem e a condução se torna mais frenética. Devido à acção algo raquítica dos discos, antecipar bem todas as manobras é uma necessidade imperativa. Fica uma impressão de leveza e de tudo a funcionar muito bem, de condução marcadamente desportiva e da estranha justa posição de conceitos que só sobreviveriam poucos anos, mais precisamente entre 1973 e 1977.

A seguir, ainda em 77, apareceriam as séries GS a quatro tempos, catapultando a Suzuki para os anos 80 com uma nova sofisticação no formato universal japonês do “quatro em linha”, mais sucessos em competição e fiabilidade lendária… mas o resto é história!

Texto: Jornal dos Clássicos/Paulo Araújo

Imagens: Vitor Barros

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