Ariel Square Four, um golpe de génio

Clássicos 27 Abr 2012

Ariel Square Four, um golpe de génio

Modelo lendário de uma marca sempre algo exclusiva, a Ariel Square Four foi um rasgo de fulgor tecnológico e uma das mais evoluídas e famosas motos inglesas. Alicerce da gama Ariel, esteve em produção 27 anos e foi a moto de maior cilindrada produzida na Grã-Bretanha durante muito tempo. Tudo começou há mais de 80 anos, quando um jovem engenheiro de nome Edward Turner rabiscou um motor de quatro cilindros em quadrado, diz a lenda, nas costas de um maço de tabaco. Turner, mais tarde notavelmente ligado à marca Triumph, ofereceu o design a várias firmas antes de ser contratado pela Ariel em 1928. O seu projecto, deveras inovador, incluía distribuição por árvores de cames movidas por correntes, e consistia, basicamente, de dois bicilíndricos horizontais girando em direcções opostas e ligados pelas cambotas. Esta concepção tinha o duplo mérito de gerar um equilíbrio automático (o movimento de um anulava o do outro) e de criar um bloco muito compacto. A Ariel foi assim capaz de começar produção da Square Four original, de 497cc de capacidade, adaptando ligeiramente o quadro duma monocilíndrica de 250cc, poupando à firma de Selly Oak, dinheiro e tempo de desenvolvimento. Essa primeira versão foi depois seguida, em 1930, de outra de 600cc, principalmente para os muitos utilizadores que queriam adicionar um sidecar à moto. O motor de Turner, porém, não era isento de problemas, o maior dos quais era o sobre-aquecimento dos cilindros traseiros. Após a sua saída da Ariel em 1936, esses problemas foram resolvidos, em parte, por outro nome famoso da indústria, Valentine Page, que remodelou o motor colocando mais alhetas na cabeça e um túnel entre os cilindros dianteiros para permitir ao ar fresco atingir a parte de trás do motor. O comando das válvulas passou a ser por varetas, comandadas por uma única árvore de cames situada entre os cilindros. Os novos motores eram mais pesados, mas também muito mais potentes, sendo o de 1000cc, em particular, mais apto que nunca a puxar um sidecar. As versões de 600 e 1000cc ficaram conhecidas como o 4F e 4G, respectivamente. O motor da 4G, todo em alumínio, baixou o peso da moto para 215 quilos, menos 11 que o modelo rígido. Entre outras coisas, o cilindro redesenhado incorporava os colectores de escape e as caixas de distribuição. O carburador único era um Solex e a taxa de compressão do motor fora aumentada de 5,8 para 6:1, embora a potência absoluta tivesse descido ligeiramente, de 36 para 34 cavalos às 5400 rpm. Em 1939, a Ariel já tinha introduzido a sua suspensão traseira “plunger” (em que um pequeno amortecedor monta o eixo da roda, deixando este mexer para cima e para baixo num curso limitado), seguida em 1946 por uma forqueta hidráulica em vez de suspensão por tirantes na dianteira. O advento da segunda guerra mundial interrompe o fabrico, mas em 1945 o modelo de 1000cc é de novo posto em produção, desaparecendo o de 600cc. Só duas saídas de escape continuavam à vista, embora a natureza do motor tetracilíndrico fosse salientada pelos dizeres “Square Four” no cárter, em vez do anterior número “1000”.

A “Squariel” dos anos 50

A Ariel era estreita para uma moto de quatro cilindros, mas com um banco bem acolchoado e guarda-lamas envolventes, estava pronta para viajar, com uma boa bateria, bomba de pneus, amortecedor de direcção e protector de corrente. Os instrumentos incluiam um amperímetro, um velocímetro Smiths e um manómetro de pressão de óleo, colocando à disposição do condutor informação muito completa. Uma caixa de quatro velocidades bastante suave completava o quadro de sofisticação. Como habitual nas inglesas, no entanto, a Ariel pingava algum óleo, especialmente quando aquecia. No início dos anos 50, dá-se o golpe que viria a provar-se fatal para a Square Four: a marca é adquirida pela BSA, e junta com a Triumph, a New Hudson e a Sunbeam. A Square Four começou então a ser afectuosamente conhecida como Squariel e, se bem que não fosse rápida para os padrões de 1952 – nem na velocidade máxima de cerca de 160 Km/h, nem na aceleração semelhante às bicilíndricas da BSA ou Triumph – a Ariel era mais suave e respondia melhor em baixa rotação a pequenas modulações do acelerador, com aceleração forte em médias para ultrapassagens. Assim, ganhou fama como montada de longas distâncias, até porque a ciclística algo mole se prestava a isso, proporcionando um comportamento que privilegiava mais o conforto do que condução desportiva. A distância ao solo era de qualquer modo muito limitada, fazendo a moto raspar no asfalto, mesmo a inclinações modestas. A travagem era também, em comum com todas as motos da época, muito diminuida, com dois fracos e estreitos tambores, um em cada roda, a requerer antecipação cuidada de qualquer situação que exigisse desaceleração viva. O descanso situado no eixo traseiro também era estranho de utilizar, mas comum na época, obrigando o utilizador a aguentar a moto vertical e vir cá atrás antes de colocar a roda solidamente no ar.
À 4G MkI seguiu-se, previsivelmente, a 4G MkII. Esta fora extensamente melhorada, com novo cilindro que incorporava quatro saídas de escape, e refrigeração melhorada pela circulação de ar através das saídas de escape. O motor tinha muitas características mais comuns nos automóveis, como carburador único com distribuição por “rail” aos 4 cilindros e distribuidor tipo carro. Outros melhoramentos eram uma nova bomba de óleo e embraiagem seca reforçada. Evolução na forma dos êmbolos viu a potência subir para 40 cavalos às 5000 rpm, permitindo ao modelo atingir os 168 km/h – em teoria. Mesmo em 1956, a moto ainda voltou a ser modernizada, com o tambor dianteiro alargado para a largura da roda, farolim tapado e roda traseira de destaque rápido. Um protótipo chegou a ter suspensão traseira de dois amortecedores, mas nunca foi posto em produção. O grande avanço, refrigeração líquida, que poderia ter resolvido para sempre os problemas de aquecimento do motor, também nunca foi posto em prática.
A Ariel acabou por encerrar a fábrica em 1967, tendo a produção total dos vários modelos Square Four chegado quase às 16 000 unidades, mas as suas características únicas e avançadas nunca a deixarão ser esquecida na história da moto inglesa.

Texto: Jornal dos Clássicos/Paulo Araújo
Imagens: Paula Brandão

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