Facel-Véga: A Última Estrela de Paris

Clássicos 17 Ago 1996

Facel-Véga: A Última Estrela de Paris

Marca nascida em 1954, a Véga foi produzida por Facel, fundada por Jean Daninos antes da Segunda Guerra Mundial. Os Véga e Facel-Véga, eram o prestígio automóvel francês ao mais alto nível, numa época em que as grandes marcas tricolores como Bugatti, Delage, Delahaye ou Hotchkiss haviam saído de cena.

Véga-Estrela de primeira grandeza e brilho no firmamento e nome proposto para a nova marca por Pierre Daninos, famoso escritor francês irmão de Jean Daninos. Última estrela de Paris, as circunstâncias anularam-lhe o brilho em França, mas permaneceu entre a fama e os famosos de todo o Mundo. Com charme e muito carisma foi um “must” na sua época. Assim é ainda hoje e nem Mónica de anos 70 nem a Venturi de anos 80 à actualidade fizeram esquecer o nome. Os Facel-Véga produzidos entre 1954-1964, escassos 3.033 no total, são exemplares muito à parte, produto de uma das mais famosas marcas francesas cujo carisma merece ser relevado.

Facel

Criada por Jean Daninos a 20 de Dezembro de 1939 em Dreux, perto de Paris, a societé des Forges et Ateliers de Constructions d’Eure et Loire compunha Facel em iniciais. Daninos possuía as Métallon (1937) e Skar (1938) que se dedicavam ao fabrico e peças em que liga leve e aço inox destinadas à indústria aeronáutica, principalmente para as sociedades Morane-Saulnier, Farman, Stamp e Bronzavia. Se bem que no início da década de 30, Jean Daninos tivesse criado no departamento de design e estilo de Citroen notáveis exemplares especiais que de protótipo nunca chegaram à fase de produção, as empresas citadas ainda não se tinham virado para o automóvel. No entanto, estes Citroen anteriores à entrada dos Michelin na empresa e muito aclamados então (Daninos deixou a Citroen devido à gestão dos Michelin) deixaram o “bichinho” do sonho automóvel em Jean Daninos para mais tarde dar outros voos…

Facel Métallon

A 6 de Agosto de 1945 as empresas agrupam-se, ligadas ao fabrico para a aeronáutica, mas certas marcas automóveis contactam a empresa para estilizar modelos especiais, executados na Facel Métallon. A Panhard com os Dyna, a Simca no modelo 8 Sport de 1948 desenhado por Daninos e, com base nos Aronde de anos 50 os atraentes coupé e cabrio Coupé-de-Ville e Océane. Encomendas da Ford-SAF ou Ford France fazem nascer o bonito e bem acabado Cométe cabrio de 1952 envolvendo Stabilimenti Farina de Itália num projecto que culminava no mais poderoso e bonito Ford Cométe Monte Carlo. Veículo militar de reconhecimento estilo “Jeep” concebido para a Delahaye e chassis para a Vespa France por acordo com a Piaggio, alargam a área de negócios da Facel-Métallon e já se antevia o fabrico de modelos automóveis de alto prestígio, muito exclusivos, prefigurando o futuro automóvel da empresa…

Bentley Franceses de Facel Métallon

Desde meados do ano 40, Jean Daninos contacta com a Rolls-Royce-Bentley, via agente da marca em França, para que a Facel-Métallon crie um modelo especial para o mercado francês com desenho e estilo Facel em associação com a Pinin Farina de Turim. O projecto é estudado com base no Bentley Mark VI avançando-se para a produção do novo Bentley Cresta, apresentado em 1948, e difundido unicamente em França por Franco-Britannic Auto, agente RR-Bentley no país. A elegância das linhas e o ar distinto do modelo (apenas 17 exemplares construídos) não passariam despercebidas a H.J. Mulliner, o grande “carrocier” inglês, que mais tarde cria o estilo do famoso Continental R de desenho tão similar, sobretudo na traseira. Três anos depois, sempre baseado no bom gosto de Daninos, cria-se o Bentley 4.5 litros de 1951 nunca passando do estado protótipo e exemplar único utilizado por Daninos como transporte pessoal.

Uma estrela no cenário automobilístico francês

Um distinto e requintado automóvel fabricado pela Facel-Métallon que teria honras de ser exposto no espaço no espaço PR no Salon de l’Auto de Paris em Outubro de 1951. Com a sua linha coupé 2+2, a grelha dianteira composta por um corpo central e dois corpos simétricos laterais colocados horizontalmente, prefigurava os Véga de 54 e, posteriormente, todos os outros Facel-Véga. Enquanto este Bentley era alvo de grande admiração, nascia dia a dia com mais força a ideia Véga, porque Daninos estava crente que enquanto as grandes marcas francesas se iam extinguindo com preços dos seus derradeiros modelos praticamente inacessíveis, era chegada a hora de renovar o prestígio automóvel francês com a criação de nova marca. Os capitais necessários foram surgindo e nasceu uma nova estrela…

Primeiro Véga 1954

Veja

O conceito base do novo automóvel assentava na produção de um modelo de topo, super-requintado em acabamentos de alto luxo, capaz de atingir altas performances dentro de um estilo coupé 2+2 com vocação para uma condução Sport ou de Grande Turismo, “rapport” à escolha da clientela. Negociações com marcas de renome para o fornecimento de motores tiveram lugar mas todas abortaram – a Facel não possuía estrutura para o seu próprio fabrico – incluindo com a Alfa-Romeo que foi de longe a hipótese com mais expectativas. Daninos necessitava de blocos suficientemente poderosos para equipar o seu novo automóvel e é nessa altura decisiva a viragem para o mercado formada por Jacques Brasseur e Roger Dumas. Quando se inicia a construção de protótipo, o novo V8 De Soto Firedome acabava de chegar e após a sua montagem, entra-se numa aturada e apurada fase de ensaios de estrada entre finais de 1952 e 1953, num teste de 130.000 Km percorridos em grande parte de noite para não atrair atenções.

A Facel- Métallon desmembra-se e formam-se as Facel SA e Métallon SA, uma virada para a nova marca automóvel, a outra continuando nos negócios do aço inox e ligas especiais. Em 1954 o novo Véga está concluído. Com as designações “Construindo por Facel” e “Facel-Powered by Firedome” é apresentado aos membros do governo francês a 22 de Julho e à imprensa internacional convidada para as fábricas de Colombes, perto de Paris, dia 29 desse mês. Um coupé Sport 2+2, com chassis tubolar extremamente rígido, suspensão dianteira independente de molas helicoidais e eixo traseiro rígido da marca britânica Salisbury. Motor da Chrysler já citado, com 4.528 cc, 180 cv às 4.400 RpM e velocidade máxima de 195 Km/h. Transmissão Pont-à-Mousson, caixa manual de quatro velocidades + MA sincronizadas.

Grelhas, parachoques, frisos e acessórios fabricados e, aço inox, jantes raiadas com porca de aperto central da marca Robergel, travões de tambor às quatro rodas com servo-freio. Interiores em couro genuíno, tipo Conolly, painel de instrumentos de tom negro com consola central, requintadíssimo. Apresentado no Salon de l’Auto d’Octobre de 1954 em Paris-Negro no tejadilho, cinza-prata metálico no restante corpo de carroceria, sete camadas de tinta celulosa, polida camada e camada-propunha aos franceses o regresso ao prestígio automóvel. Do protótipo ao exemplar definitivo alteraram-se os puxadores exteriores das portas que de embutidos na carroceria, passavam a puxadores salientes operados por botão.

10 Anos de Charme

Os 14 puxadores Véga FV de 1954 ou os 32 FV 1 e os 10 modelos descapotáveis fabricados desde os FV 1 aos FV 4 (uma beleza) dão lugar às 30 unidades do FV 2 modelo introduzido em Setembro de 1955 e modelo “charneira” para os Facel fabricados posteriormente. O emblema com o “V” de Véga passa o novo símbolo Facel-Veja, o parabrisas panorâmico é usado pela primeira vez no automóvel francês, no interior a novidade de uma obra de arte de pintura sobre metal. Um painel de instrumentos estilo raiz de nogueira numa fantástica reprodução da madeira, executada à mão pelo chefe pintor da Facel em Dreux, Marcel Bigot. Este distinto acabamento Facel, seriam um “ex-libris” até à extinção da marca. Perante o espanto de clientes pensando ver a mais bonita e nobre madeira do Mundo!

Surge em 56 o FB 2B com 74 exemplares o FV 3 e FV 3B de 1957-58 (48 e 90 exemplares produzidos) e depois em 57-58 o FV 4 de 67 unidades. O período entre 1958 e 61 traz à Facel-Veja dois distintos modelos: Exellence EX 1, um modelo de estilo que se diria ser Limousine ou grande Berline nos seus 5.28 metros, sendo um “falso-Coupé”, portas e janelas sem pilar central, vidro a todo o comprimento, portas abrindo do centro para fora. Foram produzidos 145 EX 1, enquanto o seu “irmão” Coupé do período, o HK 500 batia o record com 489 modelos gémeos. Chegam, por volta de 1960 e até 1963 as diversas variantes de “pequeno” Facel, o Facellia. O Cabriolet foi produzido em número de 675. O Coupé sai das fábricas em número de 380 enquanto o Coach 2+2 de 1961 é produzido em 48 exemplares. Raro mesmo é o segundo modelo Excellence, o EX 2, sem parabrisas panorâmicas e traseira arredondada sem “causa de peixe” com apenas oito exemplares. Entre 1961 e 64 chega aquele que é considerado de forma unanime como o mais bonito e puro dos Facel, cujo desenho de Roger Dumas é ainda hoje um dos mais belos trabalhos de estilo automóvel francês de sempre. O Facel II ou HK 2 é um dos Facel mais carismáticos produzidos em 183 unidades. Nas gamas finais Facel, nascem os Facel III Cabriolet e Coupé em 1963 mantidos até ao final da marca, com 193 e 432 exemplares. Derradeiro esforço de sobrevivência da empresa, os Facel-Véga de seis cilindros ou Facel 6 de 1964 Coupé e Cabriolet, são produzidos em número de 36 e sete exemplares, respectivamente.

Facel 6 foi o único modelo com seis cilindros

As imagens que publicámos mostram dos mais elegantes, belos e carismáticos automóveis da indústria francesa de anos 50 e 60, e também aqueles modelos poderosos, preformantes e potentes que chegaram a rivalizar com Ferrari, Aston Martin e Bentley da mesma época. Os Facel-Véga foram exportados de França para os Estados Unidos da América em grande número e nunca tendo sido eleitos como modelos de Estado pelas autoridades francesas, encontraram clientes entre Presidentes da República, embaixadores, emires, artistas, actores, actrizes (Ava Gardner tinha três Facel, um Excellence, na sua garagem de Berverly Hills), grandes financeiros e gentes abastadas do Jet-Set internacional. Em Portugal, poucos modelos de topo, mas um mais vasto de número de “pequenos” Facellia. Um dos mais brilhantes exemplos, ainda existente entre nós, um dos 145 Excellence EX 1 exemplar único no país, foi em 1959 pertença do administrador da Sociedade Comercial Guérin, representante Facel. Hoje é posse da família do seu dono inicial, José Silveira Machado, e absolutamente original como desde há 37 anos.

Foto de fábrica do Exellence EXI de 1958

A Facel-Véga Hoje

Daninos tem 90 anos, mas sabemos estar sempre activo. Viajou (viaja?) muito para Portugal, dando consultadoria no design automóvel e executando projectos. Estivemos próximos com ele não há muito tempo e a sua capacidade intelectual era espantosa. A Facel-Véga foi e é o seu orgulho. Mas, apesar de oficialmente extinta em 31 de Outubro de 1964, perante a indiferença cúmplice de muita gente em França, ela permanece viva nos cerca de 1.500 exemplares existentes nos Estados Unidos da América, França e Inglaterra, outros pelo Mundo enquanto clubes fortes e activos com um imenso culto pela marca, entre outros o Amicale Facel-Véga de Paris e os Facel-Véga Owners Club da América e de Inglaterra, tratam de prosseguir o espírito. Convosco, sua Excelência Facel-Véga o mais prestigiado Embaixador de França sobre quatro rodas, distinto, charmoso e elegante “perfume” parisiense cuja classe perdura há 42 anos.

Classificados

Siga-nos nas Redes Sociais

FacebookInstagramYoutube